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Cadastro de imóveis rurais tem graves distorções em Minas Gerais

Criado para nortear políticas ambientais e o combate à devastação, sistema vem sendo alvo de desvios que já viraram até caso de polícia. Dados mal lançados criam áreas que se sobrepõem, terrenos que invadem parques naturais e até registro de imóveis em municípios errados

Considerado pelo Ministério do Meio Ambiente e por muitos estados como uma solução para o planejamento de políticas ambientais e combate à devastação das áreas verdes brasileiras, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) tem apresentado falhas que comprometem a finalidade e a precisão do sistema, podendo alongar sua consolidação para além dos quatro anos já gastos na fase de registro. Em Minas Gerais, por exemplo, não há sequer uma previsão de tempo a ser gasto com a revisão dos erros. Por meio do CAR, os proprietários rurais devem delimitar seus terrenos, destacando áreas de preservação permanente (APP), reserva legal e nascentes, entre outras características. A meta é gerar um banco de dados fiel à situação do país, permitindo maior controle de desmatamentos e regularização florestal. Mas, em vez disso, o que se tem visto são inúmeras inconsistências, como terrenos se sobrepondo de forma caótica, propriedades avançando sobre reservas ambientais e sobre terras de comunidades tradicionais protegidas e até imóveis lançados em municípios errados.

Para quem usa a ferramenta em geoprocessamento de terrenos, essas inconformidades tornam o registro inútil, e podem demandar retificações tão longas e custosas quanto foi o processo de cadastramento. O Serviço Florestal Brasileiro (SFB) minimiza o problema, garantindo que as ferramentas de identificação de incoerências e o início da fase de inspeção e análise, em junho, poderão solucionar as contradições.

Contudo, a equipe do Estado de Minas consultou o mapeamento fornecido pelo portal do CAR e planificou, por meio de programas de geoprocessamento, as áreas registradas pelos proprietários rurais. Os terrenos intercalados, sobrepostos ou deslocados são tão evidentes que podem ser vistos sem a necessidade de filtros. E essas inconsistências não se restringem aos cadastros mineiros, mas constam em todos os estados pesquisados. “São registros tão grosseiramente equivocados que a gente consegue identificar a olho nu, só de olhar no mapa. Retificar isso tudo vai ser um trabalho custoso”, afirma o engenheiro ambiental e sanitarista Rodrigo Antônio de Medeiros, da Fundação Educacional de Caratinga (Funec).

Com o uso de dados do cadastro, o EM verificou sobreposições e registros errados, sobretudo em estados que já acumulam mais áreas do que o previsto e em municípios com grande histórico de conflitos agrários, como Abelardo Luz (SC), Colniza (MT), Iranduba (AM) e Viana (MA). Enquanto o SFB sustenta que o fato de haver mais áreas cadastradas que o previsto se deve à ampliação da fronteira agrícola do país desde 2006, especialistas sustentam que boa parte disso corresponde aos sucessivos terrenos cadastrados por proprietários rurais considerando as mesmas áreas como suas.

No Brasil, por exemplo, o censo rural de 2006 previa uma área de 397 milhões de hectares de propriedades, mas o atual cadastramento do CAR já computa 436 milhões de hectares (10% a mais). Em Minas Gerais, o salto é proporcionalmente maior, de 479 mil hectares para 652 mil hectares (36% de diferença).

“Uma das explicações para isso é que, antes, os técnicos cobravam em média R$ 2 mil para cadastrar um terreno, com trabalho de campo que durava um dia inteiro ou mais. Agora, muita gente pega o que os proprietários informam e cobra R$ 200 para fazer o CAR. Com isso a mesma pessoa cadastra dezenas de terrenos em um dia, mas todos repletos de informações imprecisas”, denuncia o coordenador executivo da Funec, Alessandro Saraiva Loreto.

O diretor-geral do Serviço Florestal Brasileiro, Raimundo Deusdará Filho, confirma que há casos como esses sendo investigados pela polícia. “Temos notícia de muitas investigações de fraudes de técnicos no cadastramento do CAR. O sistema é muito fácil e o próprio proprietário poderia usar, sem ajuda. Depois, na fase de confirmação, cabe aos estados notificar o proprietário ou posseiro para que regularize o que estiver errado”, disse.
Em Minas, as inconsistências e desvios no CAR criam situações como a de terrenos que invadem unidades de conservação, a exemplo do Parque Nacional da Serra do Cipó, onde já são comuns os problemas com propriedades vizinhas. Ficam evidentes também em áreas atingidas pela tragédia de Mariana, onde os dados lançados por proprietários rurais geram várias áreas sobrepostas, dificultando também projetos de recuperação.De olho no mapa

O que é o Cadastro Ambiental Rural (CAR)

» É um registro público eletrônico e nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais

» A finalidade do sistema é integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento

» A inscrição no CAR é feita por meio de sistema eletrônico, junto ao órgão estadual competente, na unidade da Federação em que se localiza o imóvel rural

» Traz informações como a área do imóvel, seus limites e posições geográficas, áreas de reserva legal, de proteção permanente (APP), localização de nascentes e topos de morros, entre outros

» Com o cadastramento no CAR, o proprietário ou posseiro poderá aderir ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) para reparar passivos ambientais ou infrações cometidas antes de 22 de julho de 2008, relativas à supressão irregular de vegetação

» Após a fase de cadastro, caberá aos estados corrigir as informações conflitantes ou erradas dos terrenos

Números do CAR

Região Área estimada para cadastro (hectares) Área cadastrada Diferença percentual

Minas Gerais 478.514 652.489 +36%
Brasil 397.836.864 435.755.724 10%
Sudeste 56.374.996 65.112.041 16%
Norte 93.717.515 133.360.346 43%
Sul 41.780.627 43.017.879 2,3%
Nordeste 76.074.156 67.913.451 -11%
Centro-Oeste 129.889.570 126.352.007 -3%

 

 

FONTE: Estado de Minas

 

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